Incongruências e Excentricidades no futebol

(CARLOS CASAES e CARLA MARIA)

 

O futebol, a par de ser o esporte que mais abriga a alegria e a participação do público, reúne alguns condicionamentos, os quais considero, com boa vontade, como naturais excentricidades. Muitos remontam aos “séculos”. Outros tantos se manifestam na medida em que evolui toda a sua engrenagem.

Evidente que vai aqui a opinião de um “velho” crítico esportivo que, ainda mesmo distante da atuação direta, guarda em si tantos cacoetes que o conduziram, durante cerca de vinte anos, à cuidadosa observação no confronto com as naturais elucubrações do esporte.

É provável que tantos deverão reagir em contraste a estas múltiplas colocações, mas estou seguro de que são situações, pelo menos, estranhas que justificam a preocupação.

A camisa que incomoda

Vejamos um primeiro confronto com, especialmente, o comportamento dos atletas durante as competições. Julgo uma total falta de inspiração, por exemplo, a atitude de determinados “craques” ao se manifestarem logo após a conquista de um gol. A explosão de alegria, de prazer, de reconhecimento ao ter atingido o objetivo principal e final da competição.



Observo o ato de, na expansão desse contentamento, tirar inesperada e absurdamente a camisa e atirá-la desprezada no gramado tão castigado. Não consigo compatibilizar o ato “grosseiro” e deseducado, tanto quanto indisciplinado, diria mais, desrespeitoso para com o público – ainda que este, da mesma sorte, ao calor da euforia, não lhe conceda maior atenção.

Fato é que é uma atitude mal cogitada, que nada tem de identificada com a explosiva comemoração. Há poucos dias de quantos alivio estas tergiversações, testemunhei na TV o excepcional atleta, craque inconteste, Salah (natural do Egito e contratado do Liverpool), demonstrar tal desempenho após a configuração de um belo tento. Conquanto craque consagrado, não lhe reconheço direito a tão vulgar procedimento.

E vejam, não é simplesmente o ato de desnudar-se diante do público, mas da falta de valorização da “jaqueta” que consagra o sagrado uniforme da agremiação à qual deve tanto respeito quanto consideração. Esse comportamento, lógico, confronta com o gesto simbólico e admirável de beijar o escudo da jaqueta, numa expansão emocional.



Atentem, ainda, de que, em verdade, o ato é tão recriminável que, sem exceção, é punido com o “cartão amarelo”. Há dias, uma outra ocorrência tão estranha quanto: ainda no início de um jogo aqui no Brasil, o atleta havia, por acaso, sido punido com um “cartão amarelo” por indisciplina. Logo depois, teve a felicidade de consignar um tento para a sua equipe. O que se constituiu em fato incrivelmente irreverente e irrefletido foi que, logo após marcar o gol, correu para a torcida, tirando a camisa e a lançando no gramado.

Consequência natural: recebeu o segundo “cartão amarelo” e, como não poderia deixar de ocorrer, foi punido a seguir com o “cartão vermelho”: expulsão. Ainda no início da competição.

E o ato inconsequente não se resume a apenas atletas inexperientes, em começo de carreira. Conduzidos pela empolgação de um tento. Mas vejam que jogadores com a maior experiência da mesma sorte conduzem a essa condenável atitude. Como um outro craque que costuma proceder assim é o tal de “Gabgol”. Incrível!

Comemorações “programadas”

Na mesma linha de raciocínio, vejo o ato de “inventar” a forma de comemoração. No mesmo momento da feitura de um gol. São muitos, hoje quase a maioria, que abandonam a simplicidade que enriquece uma atitude, para “inventar”, precisamente essa expressão: “inventar” num gesto, uma “performance” que lhe possa identificar a autoria de, precisamente, um gol.

Essas manifestações as considero simplesmente ridículas. Uns dão um pulinho, giram o corpo e cruzam os braços, numa expressão agressiva. É o padrão das comemorações programadas, como a de um dos maiores craques conhecidos atualmente no futebol internacional: o lusitano/madeirense CRISTIANO RONALDO. A excelência do futebol que pratica não lhe isenta, para mim, do ridículo da comemoração. O pior é que são muitos os que lhe imitam, simplesmente porque destituídos da mais acurada imaginação.

Outros, mesmo lhes seguindo os passos, buscam inovar, ainda que apenas alterando algum pormenor da atitude. Após o gol, correm em busca dos justos aplausos, mas o fazem numa intenção da mesma sorte pueril: um pulinho, e erguem os dois braços abertos em ângulo, punhos cerrados, chegam a “virar estátua”, no aguardo dos demais companheiros. Estes sim, explodindo a festa com que comemoram o excepcional feito.


Não são poucos, também, que inventam “dancinhas” ridículas e, como forma de expandir a sua alegria em momentos iguais, juntam-se a outros dois ou três companheiros para caracterizar nos “passinhos de um balé meio esquisito” a comemoração do tento conquistado. Tanto quanto um consagrado atleta brasileiro que, por sua semelhança com um ídolo das histórias em quadrinhos, logo após a feitura do tento tenta imitá-lo.

Diante desses, como tantos outros, exemplos, eu prefiro admirar e aplaudir a espontaneidade e simplicidade com que Pelé comemorava cada qual dos milésimos gols. Simplesmente deixando que a euforia o conduzisse em desabalada, durante o que exultava em tantos pulos a socar o ar. Tanto quanto a naturalidade de tantos e consagrados antigos craques. Como aqueloutros que na inesperada improvisação, lançam-se contra as arquibancadas no afã de comemorar o êxito junto da torcida.

Uma outra situação, consequência da comemoração da feitura de um “goal”, mas não menos estranha, é a forma como os colegas do autor do tento acorrem ao seu encontro para a comemoração. Incrivelmente, todos, até os reservas que saem do banco, e passam a lhe “agredir”, sim, é isto mesmo, “agredir”, com tapas sucessivos na cabeça do coitado “homenageado”.

Que alegria estranha!!!...

Porque o que causa espécie é a condição de programação prévia do “espetáculo”, quando o que é admirável, em verdade, é a espontaneidade do momento.

A agressividade inconcebível



Mas, um comportamento que tem sido mais do que habitual, nos tempos modernos, é a constância do jogo violento, resultando, quase sempre, na consignação da falta pelo árbitro, quando não seguido da exibição mesmo do “cartão amarelo”, se não do próprio “vermelho”.  E uma prática que reputo, até mesmo, criminosa, é o modo irresponsável com que, com muita frequência, aplicam o denominado “Carrinho”.


A repetida forma com que utilizam dessa violência incrível, nunca raro expõe a integridade física dos adversários à inevitável contusão, com ameaças do nível de gravidade. Na minha “lei”, todo o carrinho deveria, necessariamente, ser punido com o “cartão vermelho”, tal a intensidade da autêntica agressão.

Mas, um outro aspecto, nessa mesma linha de consideração, é a estranha e exagerada frequência como os atletas, em geral, têm usado os braços, no momento em que disputam a bola pelo alto, ou não. Se observarem bem, durante os 45 minutos de cada etapa do jogo, são, nunca raro, dezenas de intervenções dessa natureza. E a frequência no modo como agem consubstancia-se no ato de atingir o rosto do adversário até com a violência do cotovelo.

As interrupções, por essa causa, multiplicam-se na proporção da intensidade da disputa. Quando, nunca raro, a “agressão” com a mão ou o braço sobre o rosto do adversário, leva à intenção de evitar a sua aproximação.

Essa é vergonhosa

Mas há uma outra questão vinculada ao tema “violência”, que não pode deixar de ser apreciada nestas considerações: é a violência com que pequenos – felizmente são pequenos mesmo – grupos de torcedores têm extrapolado suas ações, utilizando-se da inconcebível violência.


Essa condenável manifestação tem se manifestado algumas vezes – felizmente apenas algumas vezes mesmo – tanto contra torcedores de clubes adversários como contra – igualmente – o próprio clube de sua preferência. E o que é mais grave, atingindo os próprios atletas e dirigentes, seja em manifestações em aeroportos – por exemplo – quando do retorno de alguma jornada oficial em outro Estado, ou seja nos próprios CTs, interior ou fora deles, até mesmo em algumas artérias de certas cidades.

Por consequência, tanto os clubes se têm posicionado contra essas lamentáveis inciativas, suspendendo algumas das vantagens que são concedidas às tais “torcidas organizadas”, como a própria Justiça Esportiva, e mesmo a Justiça Comum, tem adotado medidas em reação a esses tristes entreveros.

O esporte foi imaginado historicamente – e existe – para unir, para que, através dele, seja cultivada a amizade. Não é meio de sobrevivência que possa conduzir a reações agressivas e violentas. É triste essa reação de alguns poucos, ainda bem que poucos. É indispensável, portanto, que, por todos os meios e ações, essa criminosa prática seja combatida.

A frequência da simulação


Agora, uma outra atitude, que tem ocorrido e acerbamente repetida durante uma competição, é a insistência dos atletas, em geral, em “simular a gravidade da falta sofrida”. Repetidamente, num mesmo jogo, os craques, por consequência de uma falta flagrada, ainda que a mais destituída da menor violência, quedam no gramado, ou simplesmente simulam autêntico desmaio, seja contorcendo-se exageradamente, nunca raro com os rostos voltados para a grama.

E a comprovação do ato simulado é constatada imediatamente quando, simplesmente, demonstram uma recuperação tão incrível quanto instantânea. Fagueiramente levantam-se e continuam a pelear como se nada houvesse ocorrido.

E os árbitros não se dão contas da insubordinação flagrante para, em consequência, punir com cartão.

Razão pela qual não consigo entender o fato pelo qual os árbitros também ainda não se deram contas de que há frequência dessa atitude extremamente multiplicada durante um mesmo jogo. Quase sempre motivando a interrupção da partida e, igualmente, seguida da intervenção - às vezes absolutamente desnecessárias - das equipes médicas.

Do palco em que nos encontramos e por dispormos de um plano de imagem sobremaneira amplo, percebemos facilmente a simulação, cuja ignorância pelo árbitro chega a irritar.

Alguns afirmam de que Neymar teria sido o “introdutor” dessa prática, pois, por ser muito leve e exímio driblador, é atingido frequentemente pelos adversários.

Tolerância que compromete


São situações muito fáceis de serem constatadas. Como a excessiva tolerância dos árbitros às reações agressivas de atletas insatisfeitos com a consignação de penalidades.  Outra ocorrência incompreensível é a demora do VAR em registrar alguma alteração. Do lado de cá das telinhas, muito cedo somos informados e percebemos a realidade do lance, enquanto o VAR consome minutos até alertar ao árbitro.



Mas, uma outra ocorrência que vem sendo extremamente frequente é o choque entre cabeças. Têm sido impressionantes e repetidas as oportunidades em que, em lances que seriam absolutamente normais, os adversários se lançam com tanta impetuosidade que as cabeças se encontram, quase sempre resultando em lesões, por vezes, graves.


Lembro de que só conheci, ao longo de todos estes anos, e no passado, um atleta que, com alguma frequência, expunha-se a lesionar a cabeça em choque com o adversário: ARNALDO – zagueiro do Bahia, em priscas eras. A violência era sempre tal que o obrigava a continuar em campo, sempre, com a cabeça enfaixada. 

Aliás, da época, ainda memorizo a escalação de uma das mais tradicionais, poderosas e vitoriosas equipes do tricolor (época ainda do campo da Graça): Lessa, Arnaldo e Zé Grilo; Pedrinho, Ivon e Evilásio; Camerino, Gereco, Zé Hugo, Toia e Izaltino.

Todas essas situações incômodas tanto quanto a tolerância dos árbitros quando das reações dos atletas à consignação de uma irregularidade. A forma agressiva como muitos reagem, “peitando”, literalmente “peitando” os juízes e de dedo em riste. E a indiferença dos mesmos, indiscutivelmente, incomoda, não reagindo, como deveriam.

O esporte feminino como exemplo

Mas vale referir-me, também, ao fato de que nem todo o futebol do mundo registra essas inconveniências. Sou um assíduo assistente de esportes em geral e pela televisão. Seja o futebol, o vôlei, o tênis, o automobilismo, o atletismo, o ciclismo, até o golfe. E nunca raro na esfera internacional. Inclusive, com o mesmo interesse, tanto em competição masculina quanto feminina. No caso desta última, bom afirmar que é impressionante o fato de ainda, repito, ainda – embora espere que nunca se desfigure – manter um nível de disciplina simplesmente impressionante. Fazendo inveja aos “machões”.


Destacando-se, vale mencionado, a qualidade do futebol que as jovens praticam hoje. O que tem levado, sobretudo na Europa, à acorrência de um público admirável que, nunca raro, lota os estádios.

Impossível afastar-me das “canchas”

         Impossível dissociar-me da condição de crítico esportivo, atividade que exerci, repito, profissionalmente durante vinte anos. Da qual não consegui me afastar em face de ter o futebol como uma das minhas diversões preferidas. Concentrada essa preferência que sempre esteve desde, praticamente, o meu nascimento, em torno da paixão pelo grandioso ESPORTE CLUBE BAHIA.



         Como fanático espectador do esporte, portanto, tenho selecionado estas observações, as quais me concedo o prazer e o direito de, aqui, estar analisando. Por exemplo, já neste último ano nas disputas pelo campeonato brasileiro da primeira divisão, a CBF adotou, com muito acerto, assim entendo, o VAR – volto à sua análise. É um expediente que permite proporcionar subsídios ao árbitro e aos auxiliares naqueles momento em que a eventualidade não lhes concede uma observação sobremaneira clara do lance.

         Conquanto válida a iniciativa, no entanto alguns senões podem ser anotados. Por exemplo – e bom que relembre - a demora exagerada em definir o lance objetivado. Enquanto todos nós, que nos encontramos do lado de fora dos vídeos, identificamos, imediatamente, qual deva ser a real interpretação, contudo, entre a intercomunicação do árbitro com os observadores do VAR, são preciosos minutos que conduzem à interrupção desnecessária da sequência do jogo. Até que uma definição ocorra. Sobretudo quando o árbitro é conduzido ao testemunho do vídeo.

         Ainda quanto à tolerância dos juízes durante uma interveniência do VAR, estes, unanimemente, adotam uma postura ridícula, estendendo o braço, como para “barrar” a aproximação dos jogadores. Mas, incontinente, afastam-se, ainda que acompanhado pelos mesmos jogadores a lhe acossarem em protesto inaceitável.

Aliás, a maior virtude do VAR tem sido a de comprovar o quanto, até a sua adoção, os árbitros e seus auxiliares frequentemente se equivocavam em virtude da atitude de assinalar infrações. Muito especialmente na questão dos “impedimentos”. Quando, agora, a nova técnica tem demonstrado, nunca raro, o equívoco que ocorria na percepção do posicionamentos dos atletas.

Inconcebíveis protestos que agregam agressões

         Aliás, é de se observar de que o futebol cada vez tem uma postura incrivelmente agressiva, por conta da disputa dos lances. E é também de se ver, por sinal, que, a cada dia, a preparação física dos atleta é mais acurada. Nem por isto deixam de, com absurda constância, ser alvo de contusões consequentes da disputa dos lances.

         Diante destas muitas observações e com respeito, especialmente, à atuação dos juízes de futebol, no particular, lembro, historicamente, e com saudade, de um que não tolerava nada disto. Que falta faz o ARMANDO MARQUES!

         São reflexões que se inclinam na busca de uma melhor qualidade do futebol brasileiro.



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