É que o samba nasceu lá na Bahia...

A escola que fez do samba o maior espetáculo do mundo

(Carlos Cases e Carla Maria)

 

O “Samba” é o ritmo musical brasileiro que mais se destaca no contexto da criatividade dos compositores de todos os gêneros, inclusive como um dos estilos que mais se projetam no mundo. A história do “Samba” apresenta-se como um dos pilares da arte do país, em todo o seu mais amplo sentido. Além de toda genialidade dos quantos autores vêm, na história pátria, manifestando a sua vocação, gerou uma forma de se expressar que resultou em se constituir, sem qualquer dúvida, no maior espetáculo em toda a extensão do planeta Terra: a O DESFILE DAS ESCOLAS DE SAMBA.


A inspiração para gerar este escrito decorre do fato de eu ter vivenciado três de todas as etapas perseguidas por esse fantástico espetáculo. Não cheguei a participar do seu surgimento, mas, já em uma das suas primeiras afirmações, iniciei um ciclo que demandou em, pelo menos, três etapas distintas. Etapas que se consubstanciam desde aquele momento em que sua manifestação começou a ganhar força e firmeza, até o seu momento atual, quando conquistou o direito de ter reservado o seu espaço exclusivo.

Meu primeiro encontro com as Escolas

Era fevereiro de 1954. Junto ao meu irmão HÉLIO – tão saudoso – ganhando o direito de manifestar a minha alçada aos primeiros 18 anos, e nos valendo da generosidade de um amigo da família, GILDO RAIMUNDO, que era diretor na Bahia da companhia Lóide Aéreo e nos proporcionou a oportunidade de viajar ao Rio de Janeiro, tive a primeira – de quantas! – oportunidade de visitar a cidade do Rio de Janeiro, então, ainda Capital do país.


Aí vem a minha certa intimidade com o desfile das Escolas de Samba. Quando, também, começa a história de fatos interessantes sobre aquele fenômeno. O Seu desfile, então, era na bela Avenida Rio Branco. Naquele momento, ainda inexistindo a presença dos carros alegóricos, como também das passistas “com pouca roupa”. Estas, desnudadas, compunham o visual das denominadas “Sociedades” (estas sim) nos seus inúmeros carros alegóricos. O desfile das Escolas era, rigorosamente no chão e era, também, a oportunidade em que acontecia a exibição dos tantos passistas que enriqueciam o espetáculo.

E tal ocorreu até 1962, ano em que o seu desfile passou a se realizar na portentosa Avenida Presidente Vargas - pelo fato de que a Rio Branco já se mostrava acanhada para receber a multidão que já acorria ao espetáculo - a partir da frente da Igreja da Candelária e no sentido da Central do Brasil. Já ali, foram armadas as arquibancadas, coisa que não ocorria na Avenida Rio Branco. E eu lá estive com a família, numa segunda oportunidade de testemunhar o verdadeiro show de competência..

Com o advento da administração estadual de LEONEL BRIZOLA, então, ele percebeu da necessidade de assegurar ao majestoso espetáculo um local permanente e especialmente construído para lhe acolher. Foi quando projetou, fez instalar e inaugurou o consagrado Sambódromo. Inauguração que aconteceu em 1984. E o espaço escolhido para localizá-lo foi à esquerda da Presidente Vargas (no sentido Candelária/Central do Brasil e, se me não engano, em vias onde ocorria, até então, a atividade da prostituição).

Já naquela nova fase, eu também tive a felicidade de assistir ao majestoso espetáculo, em cerca de três oportunidades, no seu novo espaço, e também ao lado da minha saudosa TERESA. Mas foi, no entanto, desde a Presidente Vargas que foram adotados os tantos e belos carros alegóricos, como também o fato de que as jovens esculturais passaram, cada vez mais, a resumir sua indumentária.

É, também, uma bela história

Consta nos documentos históricos, de que o criador dos desfiles das Escolas de Samba teria sido o jornalista pernambucano MARIO FILHO. E que teria ocorrido em 1932, valendo-se do prestígio, então, do seu periódico “Mundo Esportivo”. Mas consta, da mesma sorte, que um outro recifense teria contribuído de forma decisiva para a consagração do evento: Pedro Ernesto quando era, então, Prefeito do, à época, Distrito Federal. O objetivo do seu projeto, em verdade, pretendia tornar o Rio de Janeiro como uma potência turística. O momento era do ano de 1935.



Verdadeiramente, a história das Escolas de Samba se encontra necessariamente vinculada à extrema popularidade, então, do próprio samba. Com a crescente exaltação das festividades carnavalescas, já se impondo a partir do próprio Rio de Janeiro. É da história do país, também, que, desde o século XIX, grupos de escravizados atuavam na organização das festas que já se destinavam a celebrar o Carnaval.

Do que se tem conhecimento, as primeiras Escolas de Samba das quais se tem registros foram a DEIXA FALAR, que teria sido fundada em 1926, e a MANGUEIRA, esta, em 1928. Com o desaparecimento da primeira, surgiu, então, a ESTÁCIO DE SÁ. No entanto, mais ou menos até a chegada do século XX, o Carnaval era focado em torno das valsas, das polcas, das mazurcas e, até, por sinal, das músicas escocesas. Os grupos se identificavam como poloneses, ciganos, afro-brasileiros, judeus-russos. Constituíam a classe trabalhadora da comunidade e se projetavam a compor o ritmo e a harmonia das músicas. Aquela gente, à época, fixava-se entre os estaleiros do Rio, que se situavam junto aos morros. Por sinal, aquele espaço era denominado, inclusive, de Pequena África. Pelo que se diz, ter contribuído decisivamente para a história do samba.

A Bahia entrando na história

É também a história que nos informa de que os primeiros passos daquele samba, uma dança tradicional, foram, em verdade, importados da Bahia. A partir da influência dos movimentos do Candomblé, e consequentes daquelas cerimônias religiosas. Para chegar aí, não se pode deixar de buscar as notícias de quem, em verdade, mais contribuiu para aquele movimento.

Está ali o hábito de dançar cantar e tocar instrumentos em rodas de samba. Após a abolição da escravatura, em 1888, bem assim da instituição da República, foram muitos os negros que emigraram para o Rio de Janeiro, que era, então, Capital da República, em busca de trabalho.


É quando surge a figura da TIA CIATA. Cujo nome verdadeiro era HILÁRIA BATISTA DE ALMEIDA. Era uma mãe de santo que, no Rio, morava na Praça Onze. Local onde mantinha o seu terreiro, um potencial acolhedor de músicos, entre os quais não é possível deixar de mencionar Donga, Pixinguinha e João da Baiana.

É também a história que nos esclarece de que a Tia Ciata nascera, na realidade, no Recôncavo Baiano, em 13 de janeiro de 1854, mais precisamente no município de Santo Amaro. Inclusive, da mesma sorte, informa-nos de que teria participado da fundação da Irmandade da Boa Morte, até hoje uma poderosa instituição que atua no município vizinho, de Cachoeira. Filha d’Oxum, teria sido iniciada no santo na casa Bambochê, da nação Ketu.

Tia CIATA e o Rio de Janeiro



É também afirmação histórica de que Tia CIATA teria arribado de Santo Amaro, na Bahia, para o Rio de Janeiro quando já se encontrava com os 22 anos, momento em que teria constituído uma nova família com João Batista da Silva. A verdade histórica, fornece dados de que, igualmente, seus preceitos de “santo” situavam-se na casa de João Alabá, quando se tornou na Mãe Pequena. Consta, ainda, sua presença na Pedra do Sal, no Beco João Inácio e na Rua da Alfândega nº 304. Posteriormente, transmudou-se para a rua General Pedra, Rua dos Coqueiros e, finalmente, para a rua Visconde de Itaúna, na Cidade Nova, no período de 1899 a 1924.

Mas a história do belo ritmo conta, também, que, de princípio, o samba não chegou a ser bem aceito pelos aristocratas cariocas e levou algum tempo para ser “deglutido”. A partir de certo momento, o desfile de Escolas de Samba começou a ser percebido como, na realidade, uma imitação do desfile de grupos que se apresentavam lá pelo século XIX. A partir do que começaram a se impor, nas Escolas de Samba, figuras que viriam a se consagrar como a do mestre-sala, porta-bandeira, comissão de frente, enredos, e por aí.

A desconfiança diante da movimentação dos negros

A verdade histórica, da mesma sorte, informa-nos de que as manifestações dos negros, então, não conquistaram de pronto a confiança da população, que olhava aquele movimento de “soslaio”. Por conta do que as peças resultantes passaram até a ser criminalizadas, de começo. Era o caso, por exemplo da capoeira, e do candomblé.

Era hábito dos negros, então, fazerem suas festas nas casas das “tias” ou “vovós”. Que eram figuras representadas pelas matriarcas, em verdade afrodescendentes, que, por sinal, acolhiam muito bem todo aquele batuque. À época, o mais célebre daqueles lugares, no Rio de Janeiro, era a casa da “Tia Ciata”. Já, então, mãe de santo carioca.


Foi quando alguns compositores de origem erudita, verdade, passaram a utilizar os ritmos africanos para inspirar as suas composições. Catalogam-se, nesses casos, nada mais nada menos do que CHIQUINHA GONZAGA e ERNESTO NAZARÉ. Dois dos mais consagrados nomes da história da música brasileira. Mesmo assim, o ritmo ainda não se constituía no samba como é conhecido atualmente. Até porque, nunca raro, eram denominados como “choro”, até mesmo “Valsa-Choro”, ou, estranhamente e até mesmo “Tango”.

São vários esses exemplos

Um outro consagrado compositor brasileiro que perseguiu o mesmo destino foi HEITOR VILLA-LOBOS. Fato da maior relevância histórica foi que, no ano de 1917, ocorreu no Brasil a gravação que é considerada como tendo sido do primeiro samba: PELO TELEFONE, cuja letra é atribuída a MAURO DE ALMEIDA e DONGA.

Pouco a pouco, então, o samba começou a ser introduzido nos salões da elite social da época, enquanto, por sua vez, passava a ser intimamente associado ao CARNAVAL. Àquela altura, o ritmo consagrado no Carnaval eram as marchinhas, como trilha sonora.



Com a chegada do RÁDIO, então, o samba começou a ser mais difundido, transformando-se em definitivo, e cada vez mais, no ritmo bastante popular. Coincidentemente, àquela altura, foram seguidamente sendo projetados os grandes nomes da musicalidade brasileira. Do que são expressivos exemplos: a famosa CARMEM MIRANDA, e mais ARACY DE ALMEIDA, FRANCISCO ALVES, entre um número extraordinário de consagradas expressões.

Até a era de Vinícius


Bem mais adiante, o outro consagradíssimo poeta e compositor VINICIUS DE MORAES simplesmente resumiu a gênese do samba nos seus notáveis versos. Vale, da mesma sorte, mencionada a extrema musicalidade de BADEN POWEL, já em 1967, através do seu também famoso “Samba da Benção”, ambos exaltados na letra e música: “Porque o samba nasceu lá na Bahia e se hoje ele é branco na poesia, ele é negro demais no coração”

Aqueles que comentam sobre o tema acreditam que a origem da palavra “samba” seja procedente de um termo africano “SEMBA”, que significaria “umbigada”. E esta seria uma dança executada pelos negros escravos durante os seus momentos de ausência de trabalho.

A verdade é que o SAMBA se encontra presente em todas as regiões do Brasil. No entanto, em cada uma delas, normalmente, novos elementos são incorporados ao ritmo “samba da Bahia”, ou “samba carioca”. É de se observar de que o samba da Bahia foi influenciado, também, pelos batuques e canções indígenas, enquanto no samba do Rio de Janeiro é identificada a presença do maxixe.

Verifica-se de que há controvérsias sobre a divisão do samba em escolas regionais. O grande compositor paulista ADONIRAN BARBOSA, por exemplo, rejeitava essa tese. No entanto, há musicólogos que sustentam essa tese de diferenças no samba no Rio, na Bahia ou em São Paulo, por exemplo. E são exemplos as composições: “Pelo Telefone”, de Donga e de 1916; “Brasil Pandeiro”, de Assis Valente e de 1940, “Trem das Onze”, de Adoniran Barbosa, 1964.

Os inúmeros tipos de samba

O interessante e curioso é que é possível identificar diversos tipos de samba. Vejamos alguns deles:

“Samba de Roda”, este é associado à capoeira, bem assim ao culto dos orixás, como também consta de que nasceu na Bahia, mais precisamente, no século XIX. É caracterizado por palmas e cantos, com o que os dançarinos bailam dentro de uma roda constituída pelos participantes da festa.

“Samba Enredo”, este é associado aos temas das escolas de samba, e apresenta como característica a existência de canções com temáticas de caráter histórico, social ou cultural. Essa espécie de samba foi gerado no Rio de Janeiro, precisamente pela década de 30, através da realização dos desfiles das escolas de samba.

“Samba-Canção”, esse tipo de samba é, igualmente, considerado de “samba de meio de ano”. Surgiu, também, no Rio de Janeiro, ainda na década de 20, mas veio a ser popularizado nas décadas de 50 e 60, tendo como característica própria o fato de ser uma música romântica e de ritmo lento.

Samba-Exaltação”, tendo como principal exemplo a composição “Aquarela do Brasil”, a mais famosa composição de Ary Barroso, autor que reinou entre os anos de 1903 e 1964. Suas letras desenvolvem temas patrióticos e ufanistas, na conformidade do momento histórico em que o Brasil vivia durante o Estado Novo.

“Samba de Gafieira”, dizem ser derivado do maxixe, tendo surgido lá pela década de 40, na qualidade de dança de salão, na qual o parceiro conduz a sua companheira, ambos acompanhados pelo ritmo entusiasta da orquestra.

“Pagode”, este teria também surgido no Rio de Janeiro, mais recente porque na década de 70, tendo sido originado a partir das rodas de samba, sendo um ritmo repetitivo, com destaque para os instrumentos de percussão que devem ser acompanhados pelos sons eletrônicos.

“Samba de Breque”, é considerado como o samba de partido alto; ou, também o “samba raiz”, o “samba-choro”, “samba-sincopado”, “sambalanço”, “samba carnavalesco”, “samba rock”, “samba-reggae” e até mesmo a “bossa nova”.

O Carnaval e a sua influência

A verdade é que o Carnaval desempenhou um papel fundamental para a propagação do samba no Brasil, sobretudo com as escolas e com os centros de cultura e expressão artística. Já no atual século, passou a ser considerado como um verdadeiro símbolo nacional e cultural. Por sinal, atualmente, já é oficialmente considerado como um patrimônio cultural e imaterial brasileiro.

É, ainda, referido como resultante da miscigenação entre a música africana e a europeia, tanto nos campos como na cidade. Até porque os ritmos europeus à época eram, então, a polca, a valsa, a mazurca, o minueto, dentre vários outros.

A primeira escola de samba conhecida

O que é considerado como a primeira Escola de Samba, na realidade, foi o grupo Deixa Falar, do Estácio, que era o bairro situado nos morros e entre a Praça Onze. Em verdade, foi o primeiro a ser denominado, realmente, como Escola de Samba. E a razão teria sido pelo fato de que o grupo se encontrava instalado próximo a uma escola local.  A fundação desse grupo ocorreu em 1926. Já a segunda escola foi, nada mais nada menos do que, Mangueira. Esta, em 1928. Com o passar do tempo, a Deixa Falar acabou se desintegrando, do que veio a ser originada a Estácio de Sá.



O que se afirmam, também, é que aquelas escolas que vinham surgindo pertenceriam a clubes de futebol, pelo fato de que se constituíam em áreas onde aqueles mesmo clubes atuavam. A verdade foi que, a cada ano, novas escolas vinham sendo organizadas. São exemplos, pois, Unidos da Tijuca, Salgueiro, Grande Rio, Portela e Beija-Flor.

Consta, pois, que a Deixa Falar desfilou na Praça Onze, isto pelos idos de 1929. Já àquela altura a quantidade de escolas havia alcançado 19 unidades. É das tantas anotações também de que, quem participou de alguns desfiles, como apoiadora, evidente, foi a organização “O Globo”, mais precisamente teria sido nos anos de 1932 e 1933. Oportunidade em que foi criada uma lista de quesitos destinados ao julgamento de cada desfile.

Julgamento que empolga no Sambódromo

Existem, em verdade, pelo menos, três grupos das Escolas de Samba: o Especial, bem assim o grupo A, estes que desfilam no Sambódromo, como também os grupos B, C, D e E, que desfilam em Intendente Magalhães. As do grupo Especial, desfilam nos dias de domingo e segunda-feira. As do grupo A, na sexta-feira e no sábado. Já o julgamento do Grupo Especial acontece na “quarta-feira de cinzas”. Após o julgamento, a escola que for última colocado será rebaixada para o grupo A. Enquanto isto, as seis melhores colocadas voltam à Marquês de Sapucaí no sábado seguinte. Por outro lado, a campeã do Grupo A sobe para integrar o Grupo Especial.

Enquanto que, na sede da escola vencedora, a “farra” se instala até o amanhecer do dia seguinte.



Cada escola do Grupo Especial tem cerca de 60 a 70 minutos para desfilar.  Da mesma sorte como Cada Escola, em verdade, desenvolve no seu tema uma história a cada ano, que constitui o seu enredo. A temática circula entre questões política, esporte, história, artes, para o que são criadas fantasias e alegorias simplesmente fantásticas. De referência, por sinal, ao samba-enredo, que vem a ser um subgênero do samba, este também surgiu no Rio de Janeiro na década de 30. E é ele que faz movimentada toda  escola no desfile.

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